Por Duda Monteiro de Barros
Aparelho digestivo influencia mais o cérebro do que se imaginava. Nasce um fecundo campo de estudos para compreender e tratar melhor distúrbios como ansiedade e depressão.
Não são poucos os ensinamentos de Hipócrates (460-377
a.C.) que encontram respaldo na ciência do século XXI. Entre as frases
atribuídas ao pai da medicina ocidental, está a de que “todas as doenças
começam no intestino”. Preceito que também é acolhido pela ayurveda, a medicina
tradicional indiana: para ela, o órgão responsável pela digestão e absorção dos
nutrientes é pilar da saúde. Não há dúvida: o intestino e a comunidade
microbiana que ele abriga ganham cada vez mais os holofotes em robustas
pesquisas com recursos tecnológicos de ponta. A ideia que elas corroboram
é que o ecossistema do aparelho digestivo influencia mais o organismo do que se
imaginava — principalmente a cabeça.
A conexão entre intestino e cérebro se consagra como
uma área de estudos fascinante. São Paulo acaba de sediar um congresso
científico totalmente voltado para essa interação e suas repercussões no
bem-estar das pessoas. Ali foram compartilhadas e debatidas investigações que
buscam estabelecer um elo entre desequilíbrios no sistema digestivo e na flora
intestinal e o aparecimento ou agravamento de um leque de transtornos mentais e
neurológicos — de ansiedade a Alzheimer. Dados instigantes não faltam.
Recentemente, pesquisadores holandeses analisaram amostras de fezes de mais de
2 500
pessoas e identificaram uma associação entre treze tipos de bactéria na microbiota
intestinal (o termo correto para a “flora”) e sintomas de depressão. São pistas de que há
mais interações entre a barriga e a cabeça do que sonhava a medicina. Esse
diálogo é mantido por vias mais diretas — o maior nervo do corpo, o vago, liga
o abdome ao crânio — e indiretas, por meio de substâncias químicas produzidas
pelo corpo e pelos microrganismos que caem na circulação sanguínea.
Na vanguarda, cientistas já avaliam uma técnica que,
em um primeiro momento, causa espanto, mas soa promissora: o transplante fecal.
A ideia é introduzir, por meio de uma endoscopia ou colonoscopia, uma
amostra tratada de fezes de um doador saudável em um indivíduo doente. Há
estudos em andamento apurando seus resultados em distúrbios psíquicos e
neurológicos. Hipócrates tinha razão. As vísceras têm uma história para contar.
Publicado
em VEJA de 3 de maio de 2023, edição nº 2839 SAIBA MAIS EM: https://abqv.org.br/conteudo/426/20-congresso-brasileiro-de-qualidade-de-vida-e-sucesso-de-publico-ao-abordar-as-tematicas-que-impactam-a-saude-e-o-bem-estar-dos-trabalhadores-no-mundo-hibrido
- https://veja.abril.com.br/saude/aparelho-digestivo-influencia-mais-o-cerebro-do-que-se-imaginava/
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