Folha de São Paulo, 21/03/2016
“Parece pouco dizer que a
presidente Dilma Rousseff (PT) acertou um tiro no pé ao abrigar seu padrinho no
Palácio do Planalto. A acomodação de Lula na Casa Civil representou muito mais
que isso: foi provavelmente o erro mais grosseiro de um governo pródigo em
decisões deploráveis do ponto de vista político, econômico e moral.
Pesquisa Datafolha realizada nos
dias 17 e 18 e publicada neste final de semana traduziu em números o tamanho do
descompasso que se verifica entre o governo petista e a população brasileira.
Nada menos que 73% dos
entrevistados responderam que Dilma agiu mal ao convidar o ex-presidente para
assumir o ministério. Além disso, para 36% a gestão deve piorar com a chegada
de Lula, e 38% entendem que nada mudará.
Há mais. Na opinião de 68% dos
brasileiros, Lula aceitou o cargo só para obter o chamado foro privilegiado e
escapar de um processo em primeira instância comandado pelo juiz federal Sergio
Moro.
Como se vê, a expressiva maioria
da sociedade rechaça não só a repulsiva manobra mas também a cândida explicação
difundida pelo Palácio, segundo a qual Lula estava sendo chamado somente por
suas conhecidas capacidades de articulação política e na esperança de reanimar
a economia.
Também pudera. As interceptações
telefônicas que Moro tornou públicas na semana passada, a despeito das críticas
que se possam fazer à atitude do juiz nesse caso, tiveram enorme impacto na
população. Elas revelaram o quanto Lula se mobilizava para tentar interferir
nas investigações –e dá arrepios imaginar o que poderá fazer uma vez dentro do
governo.
A esse respeito, são alarmantes
as declarações do novo ministro da Justiça, Eugênio Aragão. Em entrevista a
esta Folha, ele afirmou que vai
trocar toda a equipe de uma investigação da Polícia Federal se houver sinais de
vazamento de informação –e o fará mesmo que não tiver provas, o que configura
uma monstruosidade jurídica.
Impressiona a desfaçatez do
ministro, e não só pela deslavada intenção de usar a presunção da inocência
somente quando interessa. Justamente quando o governo que agora integra é
acusado de querer driblar a Operação Lava Jato, Aragão dobra a aposta com essa
tentativa de intimidar a PF.
Não surpreende, diante dos
acontecimentos frenéticos das últimas semanas, que a rejeição a Lula tenha
disparado entre os entrevistados pelo Datafolha. Se em 2010 o petista deixou o
Planalto com 83% de aprovação, hoje 57% dizem que não votariam nele caso
estivesse disputando uma eleição.
Na prática, desse modo, a
presença de Lula no Planalto serve somente para sublinhar as notórias inépcia
administrativa e falta de liderança presidencial, antes exacerbando os defeitos
estruturais do governo Dilma Rousseff do que evitando a rota do desastre”.
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