sexta-feira, 23 de abril de 2021

STF DESTRUIU A LAVA-JATO


Por THEODIANO BASTOS

“Na Itália, a corrupção conquistou a impunidade. Aqui, entre nós, ela quer vingança.

Quer ir atrás dos procuradores e juízes que ousaram enfrentá-la. Para que ninguém nunca mais tenha a coragem de fazê-lo. No Brasil, hoje, temos os que não querem ser punidos, o que é um sentimento humano e compreensível. Mas temos um lote muito pior, dos que não querem ficar honestos nem daqui para a frente, e que gostariam que tudo continuasse como sempre foi”, afirmou o ministro do STF, Luís Roberto Barroso, durante o julgamento de suspeição de Sergio Moro.

Após destruírem a Operação Mãos Limpas, a Itália elegeu Belusconi e o Brasil elegerá quem em 2022?

ITÁLIA, operação que inspirou Lava Jato foi fracasso e criou corruptos mais sofisticados, diz pesquisador

Luiza Bandeira- BBC Brasil ÉDITO,

Para especialista, apenas operações judiciais não acabam com corrupção no país

Responsável pelas investigações que têm incendiado o mundo político brasileiro e mergulharam o governo Dilma Rousseff em uma crise sem precedentes, a Operação Lava Jato, que completa dois anos nesta quinta-feira, é vista por muitos como esperança de pôr fim à corrupção no país.

Mas para o cientista político Alberto Vannucci, um dos maiores estudiosos da Operação "Mãos Limpas" na Itália, que serviu de inspiração para a Lava Jato, investigações judiciais não conseguem acabar com a corrupção em um país quando ela é sistêmica.

"Inquéritos judiciais, mesmo quando bem-sucedidos, podem colocar na cadeia alguns políticos, burocratas e empresários corruptos, mas não conseguem acabar com as causas enraizadas da corrupção", disse ele à BBC Brasil.

E mais. Para Vannucci, que é professor da Universidade de Pisa, a Mãos Limpas italiana ainda acabou permitindo o surgimento de mecanismos mais sofisticados de corrupção no país.

Uma das maiores operações anticorrupção da história europeia, a Mãos Limpas, ou Mani Pulite, realizada, nos anos 90, ajudou a desmantelar diversos esquemas envolvendo tanto o pagamento de propina por empresas privadas interessadas em garantir contratos com estatais e órgãos públicos quanto o desvio de recursos para o financiamento de campanhas políticas.

https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/03/160316_lavajato_dois_anos_entrevista_lab

‘Mani Pulite’. A tragédia, a farsa e a ressaca

Como isso se produziu? Um momento decisivo para o traçado desse caminho foi o começo dos anos 1990, com uma operação-limpeza capitaneada por policiais, promotores e juízes italianos. A operação Mãos Limpas (Mani Pulite – MP). Alguns dos agentes eram aparentemente bem intencionados, ainda que um pouco certos demais de suas convicções espirituais. Outros, porém, menos ambíguos, pareciam mais próximos dos prazeres da carne.

A operação foi antes de tudo uma tragédia – ainda que tenha trazido como resultado imediato um pasticiacio italiano, a era Berlusconi.

A operação teve lances cinematográficos. Um drama ao vivo e em cores. Com o espetáculo diário de vazamentos de informações escandalosas que faziam a alegria dos meios de comunicação. Ao todo, nos dois anos de operação, foram quase 5 mil prisões, mas apenas 1.300 condenações. Em compensação, 31 suicídios, entre 1992 e 1994. Vários deles com requintes de drama – eram inocentes que não suportavam a destruição de sua imagem e o desgaste psicológico. Alguns chamam essas ocorrências de “danos colaterais”, civis atingidos em uma guerra.

A tragédia foi clara: reduziu um país de enorme tradição política à figura de uma feira de horrores. Farsa e ressaca não tardariam a revelar-se.

A operação, iniciada em 1992, prendeu muitos empresários e políticos, destruiu os partidos existentes. E terminou em 1994, com a vitória de uma nova coligação de direita, chefiada por um capitão da mídia, Berlusconi, que habilmente reagrupou com rapidez toda a Itália criminosa. No meio do processo, o país afundou como nunca, em todas as dimensões. Danos colaterais, não se faz omelete sem quebrar ovos (contanto que os ovos sejam os dos outros).

A operação também bateu outros recordes. Outros países europeus já haviam tido operações similares. A operação italiana custou quatro vezes mais... não se sabe exatamente por quais razões. Talvez porque tivesse que pagar alguma propina?

Voltemos então ao começo da saga. O braço armado dessa ofensiva anti-política – inicialmente modesta, despretensiosa – foi a tal operação MP. Um punhado de juízes, procuradores e policiais coloca na sua agenda a intenção de liberar as cidades de suas redes de corrupção. A operação, que foi inicialmente conhecida como Tangentópoli – junção de pólis com tangento (propina), cresce e vai atingindo políticos cada vez mais poderosos da DC e do PSI. O PCI é atingido lateralmente, pelo envolvimento de militantes menos relevantes e, também, pelo fato de colaborar com os outros partidos, tolerando e aceitando, implicitamente, a rede de interesses escusos. A progressão dos fatos é logo capturada pela intervenção midiática – que era vista pelos agentes (juízes, promotores) como ferramenta essencial para deslegitimar a resistência dos poderosos interesses envolvidos. Só que a mídia, aparentemente, queria mais. E teve o que parecia pretender: a completa desmoralização da “partidocracia”. Assim se espalharia a convicção de que o espaço da política era o da corrupção, o espaço da “sociedade” era o da pureza. Acordo, consenso passou a significar conluio, conspiração. Com um pouquinho mais de mídia, “sociedade” passava a ser “soluções de mercado”, gestão, produção de todos os bens através de empresas privadas, supostamente mais eficientes, transparentes, imunes à corrupção. Inicio dos anos 90 essa “renovação” das ideias coletivas se completava – um novo “saber convencional” tomava posse da alma dos italianos. Um novo senso comum, privatizante. Chegava ao topo do poder o homem que representava essa nova era – um empresário efusivo e, vejam só, dono de um império de mídia. Berlusconi aparecia como alguém que não era político profissional – e um gestor ‘sério”, ainda que também ostentando seu lado de personagem de ópera de circo, um traço que iria se acentuar ao longo do tempo, até se tornar sua marca registrada.

 https://www.unicamp.br/unicamp/ju/artigos/reginaldo-correa-de-moraes/mani-pulite-tragedia-farsa-e-ressaca

 

 

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