quarta-feira, 22 de novembro de 2017

FRANS KRAJCBERG, RELATO SOBRE O RIO NEGRO,



Resultado de imagem para frans krajcberg fotosFRANS KRAJCBERG, RELATO SOBRE O RIO NEGRO,                                                                                                           por Theodiano Bastos


    Em, 1978, encontro casual com  escultor  internacionalmente  famoso Frans Krajcberg e atualmente residindo em Nova Viçosa/BA, tive também o prazer de ficar conhecendo seu companheiro de excursão pela Amazônia, especificamente o Rio Negro, o Sr. Pierre Restany, critico de Arte famoso em Paris.

    Eles haviam chegado de uma excursão de cerca de três meses subindo o Rio Negro até a fronteira com a Venezuela. 0 Sr. Frans Krajcberg mostrava-se visivelmente revoltado com a devastação da floresta  amazônica  para  transformá-la  em pastagens  para  gado bo­vino. "É uma mistificação: para que tanto espaço devastado para  o boi? Os índios, é um' crime o que estão fazendo com os índios na Amazônia. Criaram degenerados. Ensinaram-lhes a utilizar a arma de fogo para caçar e como não têm dinheiro para comprar munição estão numa situação deplorável, não sabem mais pescar nem caçar.

Tornaram-se uns degenerados. É uma completa mistificação", dizia em tom de revolta o escultor Krajcberg. Farei um manifesto denunciando o que vi na Amazônia", disse.        
    Quanto ao Sr. Pierre Restany, disse-me que publicara sua experiência tão logo chegue a Paris.
  - 0 que e que o senhor achou de sua experiência, Sr. Pierre? - Perguntei-lhe.

    - Bem, disse-me ele, o que mudou em mim não foi somente a barba crescida que o senhor esta vendo. Essa excursão pelo Rio Negro mudou toda a minha estrutura de pensamento, de filosofia de vida, de concepção de tempo e espaço, o conceito de "natura" que tinha, todo o meu modo de. pensar. - A essa altura falava com os olhos cerrados e a cabeça apoiada na mão direita, com o ·polegar e o indicador apertando as têmporas.
- No princípio, na primeira semana, a coisa foi difícil. Mas a
medida que subíamos o rio e o tempo passava, meus sentidos foram ficando mais aguçados, o olfato percebia a fragrância do ar, das plantas, ouvia mais nítido o canto das aves, o murmúrio do ar balançando as folhas. Mas o Rio Negro é indescritível  É um  espelho;  ele reflete tudo. O que os olhos veem. Não há mosquito, quase não há peixe e muito pouca caça em suas margens. É um rio misterioso. É uma coisa indescritível - dizia ainda com os olhos cerrados e voz mansa e vaga­rosa, o Sr. Pierre Restany - Ainda me encontro como se tivesse co­nhecido um outro mundo. Vocês brasileiros, não devem permitir a destruição daquele mundo. A chuva, o vento... tudo ali é diferente.

  - 0 senhor tem toda razão, senhor Pierre. Nós estamos visivel­mente preocupados com o tipo de ocupação que estão adotando para a Amazônia. Como o senhor sabe, há áreas equivalentes a países da Europa que foram devastadas para transformar-se em grandes fazen­das de gado, utilizando o método de jogar desfolhantes nas árvores e quando as folhas secam um pouco no chão, ateiam fogo, queimando tudo. Houve incêndio tão grande que um astronauta em órbita terrestre ficou alarmado com o que via, parecia que um pais inteiro pegava fogo. Depois de tudo devastado pelo fogo, voltam a sobrevoar a área jogando semente de capim e quando o capim toma uma certa altura soltam o gado dentro. É assim que as multinacionais  e grandes empresas estão ocupando a Amazônia. Um verdadeiro crime contra a natureza. Vão transformar tudo aquilo num deserto em pouco tempo. Há áreas em  que a camada  de  solo aproveitável  é tão fina, que o pisoteio de campos de pelada viram um areal em pouco tempo, parecendo o Saara. Isso nos preocupa muito. Como o Brasil poderá aproveitar a Amazônia sem destruí-la? Esse assunto me preocupa muito e gostaria de ter a honra de receber cópias dos relatórios que o senhor fará sobre essa sua viagem, inclusive do manifesto que o Sr. Frans Krajcberg pretende lançar à Nação.

    - Mas, Sr. Krajcberg, como gostaria algum dia de percorrer o Rio Negro, em termos de gastos, o que o senhor tem a dizer?

    - Olhe, gastei nessa viagem o equivalente a mais de uma volta ao mundo. Não há transporte regular, parece uma colônia do Brasil, muita revolta com o esquecimento daquilo lá. Um barco cobra uma
fortuna e um pratico só conhece determinado trecho do rio. Dali em
diante terá de se  conseguir  outro  pratico.  Tem trecho  com  mais  de 40 ilhas e ninguém sabe a direção a tomar. É uma aventura muito difícil, mas compensa  pelo que se vê. 0 Rio Negro é algo muito miste­rioso e indescritível. É um espelho; ele reflete o que seus olhos veem. Não sei o que dará, mas farei um manifesto à Nação, denuncian­do o que vi, finalizou.

Fonte: livro A PROCURA DO DESTINO, autor Theodiano Bastos https://www.amazon.com.br/dp/B01GCWLGFM



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