“Meu filho tão amado e querido por todos, tão bonito. Por
que ele e não eu, que já cumpri minha tarefa?”
Ana Arraes, ministra do
Tribunal de Contas da União e mãe de Eduardo Campos
O testamento de Campos
Merval Pereira, O Globo, 16/08/14
A oficialização da
candidatura de Marina Silva à Presidência da República pelo PSB está sendo
encaminhada sem grandes turbulências, embora aqui e ali surjam boatos que ainda
tentam inviabilizar a escolha, que tem praticamente a unanimidade não apenas
nos partidos aliados como também na família de Eduardo Campos, empenhada em
reafirmar seu legado durante a campanha eleitoral.
Cotada até mesmo
para a vice na chapa com Marina, o que dificilmente acontecerá, a viúva Renata
Campos está disposta a fazer campanha com Marina, levando a mensagem de seu
marido aos programas eleitorais, comícios e passeatas, especialmente em
Pernambuco.
Marina, mais do que
nunca, representaria um eleitorado que quer uma experiência extrema de não
política tradicional no poder. Os que defendem seu nome dizem que as ruas não
perdoarão o PSB se, mais uma vez, Marina for impedida de se candidatar à
Presidência por uma manobra de bastidores comandada pelo Palácio do Planalto.
Marina seria a
candidata das ruas, e tentarão fixar em Aécio Neves, do PSDB, a imagem de que é
o candidato dos políticos. Essa definição pode afetar a receptividade de Aécio
em parte do eleitorado que rejeita a política tradicional, mas o que ele tem de
mais eficiente são as negociações de bastidores para montar sua base de apoio,
o que faltará a Marina, mesmo que hoje ela tenha no PSB uma organização
partidária maior do que a do Partido Verde em 2010.
Por outro lado, uma
candidatura não comprometida com acordos políticos e estruturas partidárias
pode ter dificuldades na campanha e afastar um eleitorado que não quer se meter
em aventuras. A expectativa de poder que Marina exala, no entanto, faz com que,
pelo menos neste primeiro momento, as divergências regionais sejam superadas
por um espírito de conciliação.
Os representantes
do agronegócio já começaram a emitir sinais de que não recusarão o apoio a
Marina, e a palavra de ordem no momento é de apoio ao programa básico para o
setor, apresentado por Eduardo Campos na reunião com a Confederação Nacional da
Agricultura em Brasília. Se Marina, que estava presente à reunião, confirmar
esses compromissos, não haverá maiores problemas nas coligações montadas por
Eduardo Campos.
O deputado federal
Alfredo Sirkis, do PSB, que é o presidente da Comissão de Meio Ambiente da
Câmara, ressalta que existem muitos pontos de convergência entre o grupo
político de Marina e os representantes não apenas do agronegócio, como também
da agricultura familiar, o que abrange da agricultura de baixo carbono à
recuperação de pastagens e outros tópicos. Para ele, as divergências são
superestimadas, quando existe um vasto campo de convergências que podem ser
exploradas neste momento.
A questão agora
parece estar nas mãos de Marina, que já autorizou que seu nome seja levado às
diversas instâncias partidárias. O vice da chapa deve ser o candidato ao Senado
no Rio Grande do Sul Beto Albuquerque, que já conversou ontem com Marina. Os
setores da aliança mais diretamente ligados às eleições, ou “os que têm voto”
na definição de um pessebista, já estão unificados em torno dessa chapa, e
convencidos de que uma candidata como Marina, que tem no misticismo uma
característica natural, poderá aproveitar este momento para potencializar a
votação da aliança unindo a representatividade da “nova política” que ela e
Eduardo Campos defendiam à comoção causada pela morte do líder, ajudando a
levar suas bandeiras, como já defendeu seu filho mais velho.
As palavras finais
de Eduardo Campos na entrevista ao “Jornal Nacional”, na véspera de morrer, já
estão sendo tratadas como uma espécie de testamento que vai dar base à toda a
campanha: “Agora, ao lado da Marina Silva, eu quero representar a sua
indignação, o seu sonho, o seu desejo de ter um Brasil melhor. Não vamos
desistir do Brasil. É aqui onde nós vamos criar nossos filhos, é aqui onde nós
temos que criar uma sociedade mais justa. Para isso, é preciso ter a coragem de
mudar, de fazer diferente, de reunir uma agenda. É essa agenda que nos reúne, a
agenda da escola em tempo integral para todos os brasileiros, a agenda do passe
livre, a agenda de mais recursos para a Saúde, a agenda do enfrentamento do
crack, da violência. O Brasil tem jeito. Vamos juntos. Eu peço teu voto”.
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