Por THEODIANO BASTOS
Superar
uma lembrança traumática é, na maioria dos casos, uma tarefa difícil que
precisa ser enfrentada antes que prejudique as pessoas ao longo da vida e mude sua
personalidade e seu modo de ser.
O trauma é definido como uma ferida psíquica que as pessoas sofrem
como consequência de um evento negativo em sua vida que as afeta dramaticamente, causando dor e sofrimento emocional.
Não podemos mudar o passado, a experiência que nos causou tanta dor (a morte de um ente
querido, um relacionamento complicado ou ter sofrido abusos na infância) faz
parte de nossa existência e, por vezes, tem um grande valor como experiência
educacional vital, embora não tenhamos consciência disso: nos ensina e nos
prepara para enfrentar situações semelhantes no futuro.
Em Brilho Eterno de uma Mente Sem
Lembranças, o protagonista Joel decide passar por um procedimento
um tanto quanto radical: deletar todas as memórias do seu relacionamento com a
ex-namorada, Clementine, que não terminou lá muito bem.
Parece
ficção científica, mas um documentário recente do canal americano PBS, Memory Hackers,
mostrou que estamos
mais perto do que nunca de conseguir apagar lembranças dolorosas – e até mesmo
implantar outras, tão convincentes quanto.
Mas
como deletar uma memória? Antes de chegar aí, é preciso entender como as
memórias se formam e se mantém vivas em nossos cérebros. No
passado, a ciência acreditava que as memórias ficavam armazenadas em um ponto
específico, como uma "caixinha de lembranças"; na verdade, cada
memória que temos está cheia de conexões em todo o cérebro, o que torna bem
mais difícil apagá-las.
Para
a memória se formar, é preciso que proteínas estimulem nossas células cerebrais
o suficiente para crescerem e formar novas conexões. Assim que isso acontece, a
memória fica "guardada" na mente, e em geral fica lá até ser acessada
novamente por nós. Mas
memórias de longo prazo não são estáveis: sempre que revisitamos essa
lembrança, ela se torna mais "maleável" e forte do que antes, em um
processo chamado de "reconsolidação". Esse
fenômeno também explica porque algumas lembranças mudam um pouco ao longo dos
anos, e é justamente ele que pode oferecer um caminho para cientistas
conseguirem "hackear" memórias.
Em
uma entrevista ao The
Telegraph, o cientista Richard Gray, um dos responsáveis pela pesquisa,
explica: "nosso estudo sugere que memórias podem ser manipuladas porque
elas 'agem' como se fossem feitas de vidro, em um estado antes de ele se tornar
sólido. Quando uma memória é 'solicitada' novamente, contudo, ela volta a esse
estado maleável e permite alterações".
Não são poucos os estudos
que sugerem uma relação entre um químico produzido pelo nosso cérebro, a
norepinefrina ou noradrenalina (em geral, ativada em situações de briga ou
ansiedade ao voar, e a causadora das mãos suadas e do coração acelerado nessas
situações estressantes), e as memórias traumáticas.
Ao bloquear a produção
desse químico, os pesquisadores podem "afastar" essas lembranças
dolorosas e impedir que sejam associadas a emoções negativas. Para provar isso, os
pesquisadores fizeram um teste com pessoas que tem pavor de aranhas: três
grupos de voluntários com aracnobofia foram organizados. Dois deles encararam
uma tarântula em uma garrafa de vidro, para que suas memórias traumatizantes
com aranhas fossem ativadas, e então receberam propranolol ou um placebo.
O terceiro grupo recebeu apenas propranolol, sem ver a aranha, para que os
pesquisadores pudessem eliminar a possibilidade de que a droga, simplesmente,
pudesse reduzir o medo.
Nos meses que se seguiram,
os grupos foram novamente apresentados a uma tarântula, e o medo que sentiram
foi medido. Os
resultados foram, no mínimo, incríveis – enquanto o grupo que recebeu
placebo ou não foi exposto a aranha continuou com o mesmo medo, aqueles
que receberam a droga e encararam a tarântula foram capazes de tocar o animal
em poucos dias. Em três meses, a maioria deles foi capaz
de segurar a aranha confortavelmente, e o medo não voltou por mais de um ano.
A fobia havia sido, para
todos os efeitos, "deletada".
Em 2007, um teste foi feito
com a mesma droga, dessa vez aplicada em pacientes com um trauma. Durante dez
dias, cada participante da pesquisa recebeu propranolol ou placebo, e então era
convidado para descrever memórias do evento traumático. Quem recebeu a droga não
esqueceu o trauma, mas após uma semana de medicações, foi capaz de contar a
história novamente, com muito menos estresse.
Até onde sabemos, os
pesquisadores ainda não tentaram oficialmente deletar uma memória completamente
em humanos, especialmente por conta das implicações éticas disso. Mas é algo realmente possível,
com uma combinação correta de drogas e exercícios de memória,
de acordo com o ScienceAlert. O
mais apavorante, contudo, é a possibilidade de implantar memórias falsas.
De acordo com os
pesquisadores do Memory Hackers, a ideia da pesquisa não é apagar inteiramente
as memórias tristes das pessoas, e sim torná-las menos estressantes
ou dolorosas.
De acordo com a pesquisa, não
são exatamente as memórias que nos causam dor, e sim as associações que fazemos
a elas.
Além disso, a descoberta
pode ser útil para tratamentos de ansiedade e fobias. "Não queremos limpar
nossos 'hard drivres'... A habilidade de esquecer coisas doloridas nos permite
criar novas histórias sobre quem somos", disse o criador do Memory
Hackers, Michael Bicks. Você apagaria alguma lembrança sua?
SAIBA MAIS EM: https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/noticia/2016/02/cientistas-descobrem-como-apagar-memorias-dolorosas-e-implantar-novas.html
- https://amenteemaravilhosa.com.br/5-passos-superar-uma-lembranca-traumatica/