Diz Gilberto de Mello
Kujawski em carta publicada em VEJA de 28/09/16.
Não concordo com essa visão de que a prisão de Lula “provocará
a maior ressaca do Atlântico”. Haverá reação de seus adeptos, sim, mas que não chega a
10%, mas a esmagadora maioria, 83%, fará um tremendo carnaval. Vejam os dados que seguem:
Nome de Lula gera 73% de rejeição para prefeito, dia pesquisa.
O ex-presidente é o maior afastador de votos na opinião
dos eleitores paulistanos
A mesma pesquisa perguntou qual era, na opinião do eleitor, o candidato a prefeito que tinha o apoio de Lula e 35% dos entrevistados disseram Fernando Haddad (PT), no entanto, a maioria, 48%, afirmou que não sabe quem é o candidato apoiado por Lula. Para 2% dos entrevistados, Lula está apoiando a ex-prefeita Luiza Erundina, que concorre pelo Psol.
Ainda segundo o Datafolha, 11% dos eleitores afirmaram que votariam em um candidado apoiado por Lula, outros 14% ficariam na dúvida e "talvez" votassem.
A pesquisa também testou a força do apoio do governador Geraldo Alckmin (PSDB), que teve uma rejeição 51% dos eleitores, e do presidente interino Michel Temer (PMDB), que teve 65% de rejeição.
Os pesquisadores do Datafolha ouviram 1.092 eleitores nos dias 23 e 24 de agosto. A pesquisa foi registrada no TRE (Tribunal Regional Eleitoral) sob o número de protocolo SP-01183/2016. Fonte: http://noticias.r7.com/ 29/09/16
O SOCIOPATA ENTRE NÓS,
por Fernando Portela Câmara
Prof. Associado, UFRJ
Prof. Associado, UFRJ
“O transtorno de personalidade
antissocial ganhou a imaginação popular na figura estereotipada de criminosos
frios nos romances, novelas e filmes, que tornaram a personalidade antissocial
uma caricatura de criminosos desalmados, assassinos frios, terroristas
desumanos e empedernidos. Não é bem assim.
Dificilmente esses tipos serão classificados
como antissociais ou psicopatas. A maioria dos sociopatas não é consciente de
suas dificuldades e age por impulso e sem censura aos seus desejos socialmente
prejudiciais. Os mais esclarecidos procuram saber o que acontece com eles,
quando tem insight suficiente para
correlacionar algumas de suas dificuldades com a sua forma de ser, chegando a
entender o seu caráter e estabelecendo alguns limites que lhe proporcionem uma
vida social mais equilibrada. Isso não é muito comum. O transtorno pode também
se atenuar com a idade madura, quando a reflexão passa a ganhar mais espaço na
vida do individuo. Um sociopata pode procurar um psicoterapeuta para discutir
dificuldades que ele mesmo não sabe ser decorrente da personalidade, mas nem
sempre o psicoterapeuta perceberá o transtorno e frequentemente encaixará suas
queixas em algum transtorno do eixo I. No Brasil, o elevado nível de violência
e delitos no cotidiano das pessoas reduz a visibilidade deste transtorno de
personalidade, e o sociopata só será visível dentro de um cenário forense, ao
ser confrontado por um psiquiatra experiente num ambiente controlado. Este
expediente, contudo, seleciona somente os sociopatas que se encaixam no
constructo forense de “psicopatia”, na verdade uma subpopulação do transtorno
antissocial. O sociopata não deve ser considerado um “criminoso nato”,
destacando-se nesse caso suas tendências sádicas, narcisismo elevado, falta de
empatia, oportunismo e insensibilidade ao sofrimento alheio, fatores que
frequentemente levam a conflitos com familiares e colegas. Entretanto, a
associação entre sociopatia e problemas com a lei é significativamente maior na
população prisional em comparação com a população geral, isto porque, neste
caso, é a subpopulação de psicopatas que está prevalecendo. A maioria dos sociopatas
está entre nós, criam muitos conflitos, mas não chegam a ultrapassar o limite o
comportamento criminoso. Demonizar o sociopata é um erro que pode trazer graves
consequências, tais como usar o estigma para prejudicar moralmente adversários
e desafetos, como hoje se observa (muitas vezes o próprio acusador pode
esconder sob o ato difamatório sua própria sociopatia). Esse afrouxamento do conceito de sociopatia
faz com que a visibilidade do transtorno seja prejudicada em nosso meio.
A característica que mais se destaca
na personalidade antissocial e da qual deriva este designação é a sua
dificuldade de respeitar as normas sociais. Eles não introjetam o princípio da
lei e ordem como norma de convivência social, e por isso incitam e deflagram
impulsivamente arruaças, agressões, depredações, provocações e outros atos
considerados ilegais e prejudiciais à ordem social. As frequentes arruaças e
depredações ocorridas no Brasil recentemente são manifestações antissociais,
mas não se pode dizer que todos os seus participantes sejam sociopatas. Uma
minoria o é, e esta deflagra a violência social contagiando inocentes ociosos
excitados pela situação do momento e desejosos de aventuras, frequentemente
malogrados em prisões e processos. Fica assim difícil caracterizar o sociopata
nesse cenário, e uma investigação forense seria demorada e muito trabalhosa,
sem nenhum utilidade dado que se trata de manifestações políticas
frequentemente organizadas para envolver uma grande parcela de jovens
idealistas e sonhadores. A maioria da população é sugestionável, e a excitação
coletiva leva a um abaissment do niveau
mental em que passa a predominar uma inteligência de enxame, primitiva,
anônima e animal.
Nos países com normas sociais bem
definidas e socialmente estruturadas, o comportamento antissocial é punido com
medidas judiciais agravadas com a reincidência. No Brasil, a falta de percepção
do sistema legal para a inibição da sociopatia com medidas punitivas severas, a
excessiva liberalidade para com criminosos reincidentes, e a dissonância
cognitiva generalizada do conceito social da autoridade, fazem com que o
ativismo sociopático seja endêmico. Nos países judicialmente funcionais cresce
a discussão sobre a possibilidade de se detectar precocemente a personalidade sociopática,
dado que é considerada um transtorno global de personalidade, mas o conceito é
insuficientemente definido para que se possa incluir nesse transtorno crianças
e adolescentes jovens. Há correntes psiquiátricas que admitem a existência de
sinais precoces, mas enquanto os determinantes e fatores de risco desse
transtorno não forem esclarecidos e comprovados, tudo não passa de especulação.
A personalidade infanto-juvenil é demasiadamente proteiforme para atribuirmos a
ela características patogenéticas estáveis e globais. Crianças com
comportamento antissocial na escola ou praticante de bullying não devem ser
consideradas sociopáticas. “Comportamento antissocial” não é a mesma coisa que
“personalidade antissocial”. Em sociedades cuja ordem social é frouxa e a
autoridade vacilante, o comportamento antissocial é largamente incentivado
entre jovens.
A personalidade sociopática só tem
visibilidade nas sociedades em que a conduta antissocial é culturalmente
detectada e punida severamente. Em sociedades tolerantes como a nossa, o
transtorno não é visível e frequentemente desconstruído no jargão da “exclusão
social”, “sociedade injusta”, “vítima sociais”, etc. sem um critério bem
definido biopsicossocialmente. Impressiona a proporção de autoridades
políticas, judiciárias e educacionais que confundem sociopatia com
“desassistência social”.
O sociopata apresenta déficits
sociais que inevitavelmente o leva a transgredir as normas, desafiar a ordem e
margear as franjas da lei. Esses déficits podem ter uma base neurobiológica,
mas não existem ainda trabalhos suficientes para decidir sobre essa questão,
especialmente num momento em que a neurobiologia virou modismo e chavão para
explicar todo tipo de problema psíquico, social e até mesmo econômico! A pertissocial
é tipicamente narcisista, imatura, insensível, impulsiva e parasitária, mas a
sua detecção não deve se basear em um ou dois dados, mais em um conjunto de
atitudes comportamentais características
emolduradas em um histórico convincente. Relacionamos abaixo algumas
características da personalidade antissocial frequentemente observadas no nosso
cotidiano, insistindo que uma característica tomada isoladamente não tem valor
taxonômico.
A tendência a correr riscos
desnecessários, sem se preocupar com sua segurança e a dos outros, são tidas
geralmente como um traço de personalidade antissocial. Um traço antissocial
característico é o sujeito que dirige seu carro de forma imprudente na cidade e
na estradas, sem se importar com os outros motoristas, pedestres ou regras.
Entre esses destacamos os que dirigem alcoolizados, sabendo que isso pode
trazer graves prejuízos a si e a outrem, mas não estão preocupados com os dados
que possam causar, pois não pensam nessa direção, mas na facilidade que podem
dispor para escapar à lei. Esse comportamento não é percebido em nosso meio
como sociopático, pois nossa cultura não parece assimilar este conceito na
ordem social, e uma prova disso é a tolerância aos episódios frequentes de
vandalismo que há pouco mais de um ano vitimizam nossa sociedade, superpondo-se
aos legítimos movimentos de protestos da população contra adebacle político-moral da sociedade
brasileira contemporânea.
A irresponsabilidade é uma marca na
personalidade sociopática, especialmente porque o sociopata atua em direção à
satisfação imediata dos seus desejos, não pesa as conseqüências dos seus
objetivos. É um traço infantil, denotando imaturidade dessa personalidade, que
inclusive se estende a certos aspectos físicos. A incapacidade de adiar o
desejo leva tais indivíduos a cometerem pequenos delitos tais como furtos,
mentiras, falsificações, manipulações enfim tudo que proporcione a satisfação
imediata de seus desejos. Essa versatilidade é típica dos criminosos sociopatas,
e também é essa impulsividade que os levam a reincidir. São escravos dos seus
impulsos, não aprendem com a experiência, para eles os fins justificam os
meios.
O sociopata tem dificuldade em introjetar
moralidade pública e ética profissional em sua conduta, não tem a experiência
interna de culpa e remorso, e não empatizam
com o outro. O sociopata não é solidário com o sofrimento alheio, e por isso
poderá infligir sofrimento nos outros sem culpa ou remorso, agindo
naturalmente. Não se importa em ajudar alguém ferido ou acidentado, se tiver
algo mais urgente a fazer. São incapazes de solidarizar-se e compartilhar, de
respeitar a propriedade alheia, não hesitam em enganar as pessoas com quem
convive para obter vantagens pessoais, e pode mesmo se fazer passar por outras
pessoas ou usar identidades falsas com esse objetivo, tudo isso em função de
alcançar a satisfação imediata de suas necessidades e desejos. A ingenuidade
com que praticam tais atos, sem medir as consequências, faz com sejam
facilmente descobertos, e mesmo que penalizados por tais atos, voltarão a
delinquir naturalmente. Por não aceitarem o erro ou delito, se vêem como
vítimas e defenderão essa atitude com veemência, não raro ganhando adeptos para
a sua causa, tamanha a capacidade de convencimento que imprimem em seus
protestos, inclusive juízes.
O caráter impulsivo desse transtorno
de personalidade, sua irresponsabilidade para com os valores alheios e com o
trabalho, sempre atuarão quando a necessidade ou a situação ative esse lado
sombrio da personalidade. Assim, falsificarão resultados, relatórios,
negligenciarão procedimentos, encobrirão erros que poderão prejudicar uma
comunidade inteira, praticarão delitos sempre que a oportunidade os favoreçam,
usarão a ingenuidade ou o amor dos outros para obter vantagens e até mesmo
parasitá-los, e se descobertos ou responsabilizados se comportarão como
vítimas, não porque sejam maquiavélicos (geralmente não o são), mas porque
acreditam serem, de fato, vítimas da sociedade, do sistema, da perseguição dos
outros, etc. pois não são modulados por sentimento de culpa ou remorso. Os sociopatas
são geralmente indolentes no trabalho, rendem pouco, falsificam resultados,
relatórios, despesas, são faltosos contumazes, criam conflitos no ambiente de
trabalho, e mudam frequentemente de emprego, vivem frequentemente “encostados”
no INSS, alternando com salário desemprego ou outras facilidades que satisfaçam
o seu natural parasitismo. Identificamos tais personalidades muita vezes pelos
seus resultados, que isso pode ser especialmente nefasto nos ambientes
científicos, médicos, empresariais, e outros que exigem responsabilidade
técnica, vital e credibilidade.
Não devemos confundir personalidade
antissocial com psicopatia. Como já foi dito acima, a personalidade psicopática
é um constructo forense restrito, uma subpopulação do transtorno de
personalidade antissocial, portadora de um perfil criminoso comprovado pelo
registro penal. Muitos portadores de personalidade antissocial convivem conosco
trabalhando e cumprindo as normas tanto quanto possam, embora sejam, na maioria
das vezes, fontes de conflitos crônicos. Eles podem ser ajudados quando
percebem que se conduzem “algo errado”, e podem também se controlar em um ambiente
onde haja supervisão de desempenho e exigência de conduta e decoro, mas
soltarão as rédeas nas ocasiões permissivas. Enfim, eles se controlam quando
sabem que terão uma boa chance de serem punidos se agirem “por instinto”
próprio, ou se não puderem culpar alguém.
Por fim, os sociopatas emocionalmente
instáveis, impulsivos e que exibem hostilidade aberta quando frustrados são sociopatas
primários. Não sentem culpa ou vergonha e não formam laços afetivos. Os sociopatas
secundários ou funcionais formam laços afetivos, embora peculiares e seletivos,
são mais controlados e mais estáveis. De um modo geral, os sociopatas são
astênicos, indolentes, algo apáticos, e se excitam com emoções novas e por isso
buscam experiências excitantes.” Fonte: http://www.polbr.med.br/