Por THEODIANO
BASTOS
Entenda como o Brasil se tornou dependente de fertilizantes
A
guerra na Ucrânia tem potencial devastador no agronegócio brasileiro, devido à
dependência do país de fertilizantes importados. Mas nem sempre foi assim. A
Petrobras já chegou a ser a maior produtora de nitrogenados do mundo, mas
deixou o negócio para focar em petróleo e gás, em 2018.
A
decisão, segundo especialistas, fez parte de um plano de negócios da estatal, a
partir de 2016, que previa desinvestimentos em áreas que não eram o principal
foco da empresa — petróleo e gás — para reduzir a sua então dívida de US$ 160
bilhões.
Apesar do clima favorável, o solo brasileiro é carente de nutrientes, o que torna essencial o uso
das substâncias para a produção agrícola. O Brasil é hoje o quarto consumidor global de fertilizantes, atrás de China, Índia e Estados Unidos, e o maior
importador mundial de NPK (nitrogênio, fósforo e potássio) Venda de unidade
para grupo russo
No
plano, a estatal alegou que produzir fertilizantes dava prejuízo e arrendou e
vendeu fábricas em Sergipe, na Bahia, Paraná e Mato Grosso do Sul. Em
Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul, a unidade que estava sendo construída, foi
vendida para o grupo russo Acron para produzir uréia fertilizante. Também
para diminuir seu endividamento, a Vale decidiu, em 2016, vender suas plantas e
investimentos em fertilizantes.
“Esta
transação reforça o pilar estratégico da Vale de disciplina na alocação de
capital e o contínuo foco em nossos principais negócios”, afirmou a empresa em
nota em 2021, quando terminou de vender sua participação na Mosaic, produtora
de potássio e fertilizante de fosfato.
Amazonas, a maioria das
principais minas de potássio, substância usada em fertilizantes para o
agronegócio, está localizada fora de terras indígenas. Os dados contrariam
declarações do presidente Jair Bolsonaro, que tem defendido a aprovação de
projeto de lei que libera a mineração em áreas demarcadas como
forma de superar a dependência brasileira da Rússia no acesso a fertilizantes.
Bolsonaro alega que os
locais mais importantes para extração de potássio do Brasil estão bloqueados
por estarem dentro de aldeias. “Como deputado, discursei sobre nossa
dependência do potássio da Rússia. Citei três problemas: ambiental,
indígena e a quem pertencia o direito exploratório na foz do Rio Madeira. Nosso
Projeto de Lei 191 ‘permite a exploração de recursos minerais, hídricos e
orgânicos em terras indígenas’. Uma vez aprovado, resolve-se um desses
problemas”, disse o presidente na semana passada.
Para pressionar o Congresso, o líder do governo pediu então
urgência na votação do projeto de lei. Ontem, Bolsonaro voltou a dizer que a
guerra entre Rússia e Ucrânia trouxe uma “boa oportunidade”
para o Brasil aprovar a exploração de terras indígenas.
Desde a foz do Rio Madeira, que
deságua no Rio Amazonas, passando por municípios como Autazes, Nova Olinda do
Norte e Borba, há dezenas de áreas, em diferentes etapas de pesquisa mineral,
em nome da Petrobras e da
companhia Potássio do Brasil, controlada pelo banco canadense Forbes &
Manhattan. As duas empresas praticamente controlam os projetos de potássio na
região, concentrando a maioria dos títulos minerários do insumo.
Esses dados fazem parte do levantamento feito pela reportagem
nos registros de pedidos de pesquisa e lavra de potássio ativos na Agência Nacional de Mineração (ANM).
O Estadão também solicitou
à Associação Brasileira das Empresas de Pesquisa
Mineral e Mineração (ABPM) que elaborasse um mapa com
pedidos ativos ao longo da calha do Rio Madeira, no Amazonas, que concentra as
maiores minas de potássio do Brasil. Foi feito cruzamento com a localização das
terras indígenas da região.
O resultado mostra que não há sobreposição na imensa maioria dos
casos, o que significa que não são as terras indígenas que impedem a exploração
de potássio no País. O levantamento mostra que um pequeno número de blocos de
exploração teria impacto direto em terras demarcadas, como ocorre na região de
Nova Olinda do Norte, em áreas que estão em fase de pesquisa na região das
terras indígenas Gavião, Jauary e Murutinga/Tracajá.
A reportagem
questionou a Petrobras sobre as razões de a empresa manter dezenas de títulos
minerários de potássio desde os anos 1970 na região, e quais as expectativas de
exploração dessas áreas. Em nota, a companhia disse apenas que “mantém títulos
de lavra e de pesquisa com potencial de potássio na Bacia do Amazonas” e que
“estuda alternativas para os ativos, considerando sua estratégia de negócio”.
https://economia.ig.com.br/2022-03-04/fertilizantes-dependencia-brasil-agropecuaria.html