sábado, 2 de janeiro de 2016

CARTA ABERTA A LULA, por FERREIRA GULLAR



Ferreira Gullar
CARTA ABERTA A LULA

Desculpe se em vez de uma carta pessoal escrevo-lhe na página de um jornal, tornando público o que tenho a lhe dizer. A razão disso é que o assunto que pretendo abordar nada tem de íntimo. Pelo contrário, diz respeito a todos nós. Trata-se de sua posição em face de tudo o que está acontecendo neste nosso país governado, há quase treze anos, pelo seu partido, o PT.

Entendo que você, a certa altura da vida, tenha acreditado que Lula era um verdadeiro líder operário e que, como tal, conduziria os trabalhadores e o povo pobre na luta pela transformação da sociedade brasileira, a fim de torná-la menos injusta.

Era natural que fizesse essa opção, uma vez que lutar contra a desigualdade sempre fez parte de seus princípios. E muita gente boa, antes de você, também pusera sua esperança neste novo partido que nascia para mudar o Brasil. Alguns dos mais notáveis intelectuais brasileiros fizeram a mesma escolha que você.

É verdade também que, com o passar dos anos, essa convicção se desfez: Lula não era o que eles pensavam que fosse, e o seu partido não se manteve fiel ao que prometera. Mas você, não, você continua confiando em Lula e votando em todos aqueles que Lula indica, ainda que não os conheça ou, o que é pior, mesmo sabendo que não são nenhuma flor que se cheire.

Sei que há petistas mais cegos que você, como aqueles que foram às ruas para tentar impedir a privatização da Telefônica, alegando que se tratava de uma traição ao povo brasileiro. Lembra-se? Pois bem, a privatização foi feita e, graças a ela, o faxineiro aqui do prédio tem telefone celular. Mas, quando alguém fala disso, você muda de assunto.

Sei muito bem que política é coisa complicada. A pessoa defende determinada posição do seu partido, discute com os amigos, briga e, depois, aconteça o que acontecer, não dá o braço a torcer.

E, às vezes, chega ao ponto de defender atitudes indefensáveis, mas que, por terem sido tomadas por Lula, você se sente na obrigação de justificar. Por exemplo, quando Lula abraçou Paulo Maluf, quando se aliou ao bispo Edir Macedo, fazendo do bispo Crivela ministro do seu governo e quando viaja à custas da Odebrecht.

Não sei o que você diz a si mesmo quando, à noite, deita a cabeça no travesseiro. Como justificar o mensalão? Você poderia acreditar que Delúbio, tesoureiro do PT, tenha armado toda aquela patranha, sem nada dizer ao Lula, durante os churrascos que preparava para ele, todo domingo, na Granja do Torto. Tinha de acreditar, pois, do contrário, teria de admitir que Lula foi o verdadeiro mentor do mensalão.

Custa crer como você consegue dormir em meio a tanta mentira. E pior é agora, no chamado petrolão, que é o mensalão multiplicado por dez, já que, enquanto naquele a falcatrua era de algumas dezenas de milhões de reais, neste chega a bilhões. E, mesmo assim, consegue dormir? Não é para sacanear, mas você ainda repete aquele lema em que o PT dizia ser "o partido que não rouba nem deixa roubar"?

Quero crer que, pelo menos nisso, você se manca, porque as delações premiadas deixaram claro que ele não apenas deixa, como rouba também.

E a Dilma, que Lula tirou do bolso do colete e fez presidente da República, sem que antes tivesse sido sequer vereadora? Não chego a considerá-la paspalhona, como a chamou Delfim Neto, embora, com sua arrogância, tenha arrastado o país à bancarrota em que se encontra agora. Essa situação crítica a obrigou a adotar um programa econômico que sempre rejeitou e combateu.

Mas, ainda assim, tem o desplante de dizer que esta crise é apenas uma transição para a segunda etapa de seu plano de governo. Noutras palavras: a primeira etapa foi para levar o país à bancarrota e a segunda, agora, é para tentar salvá-lo. Ou seja, estava tudo planejado!

Não me diga que acredita nisso, camarada.
  
Ferreira Gullar é Poeta e escritor. Originalmente publicado na Folha de São Paulo em 18 de outubro de 2015.



terça-feira, 29 de dezembro de 2015

MAURÍCIO MACRI NA ARGENTINA: INFLUÊNCIA NO BRASIL



MAURÍCIO MACRI VENCE NA ARGENTINA 
 
Conheci Buenos Aires em fevereiro de 2003 em plena efervescência da disputa eleitoral vencida por Nestor Kirchner. Assisti alguns discursos inflamados e a chapa Carlos Menem/Romero inundada a cidade de cartazes. O Menem há fora presidente e havia levado a Argentina à derrocada econômica mas queria voltar ao poder. Ficamos hospedados num hotel ao lado do Congresso. Na praça em frente pessoas vendiam seus pertences,  até sapatos usados, enquanto sob a marquise de um prédio ao lado do hotel, famílias inteiras dormiam sobre colchões numa noite chuvosa, uma cena triste e assustadora, pois eram idosos e seus filhos e até netos. Eram pessoa da classe média Durante o dia vovozinhas tricotavam em cadeiras em cadeiras de descanso. As cenas se repetiam  nos bairros da periferia, mas com família humildes.
Entre 2001 e 2003 a Argentina viveu momentos de turbulências políticas com Fernando de La Rúa na presidências e as renúncias sucessivas de seus sucessores. A crise vem desde 1989 com a grave dívida externa e o desemprego.
É bom lembrar que os dois presidentes não peronistas desde a redemocratização não terminaram seus mandatos: Raúl Alfonsín e Fernando De La Rúa...

Mauricio Macri sinaliza guinada geopolítica na América do Sul

“Dez anos depois da Cúpula das Américas de 2005, em Mar del Plata, que representou uma ruptura com os EUA de governos esquerdistas latino-americanos – especialmente Brasil, Argentina e Venezuela –, as eleições argentinas apontam para uma guinada completa no equilíbrio geopolítico regional. O liberal Mauricio Macri, líder da oposição e favorito para o segundo turno de 22 de novembro, sinaliza a intenção de alterar em 180 graus a política externa adotada na última década pelos presidentes Néstor e Cristina Kirchner. A principal frente seria a Venezuela, onde Macri exige a libertação do político oposicionista Leopoldo López.
O equilíbrio de poder sul-americano, vai mudar de qualquer jeito, porque o candidato governista Daniel Scioli mantém melhores relações com os EUA do que a atual presidenta, Cristina Fernández de Kirchner, e também prometeu se aproximar da União Europeia se for eleito. Mas a guinada com Macri seria mais radical.
Enquanto Scioli recebeu o apoio de líderes da esquerda sul-americana, como Lula, Dilma Rousseff, Evo Morales e Rafael Correa, e evitou qualquer crítica ao venezuelano Nicolás Maduro, Macri segue uma linha bem diferente. “Teremos uma posição sensata com os EUA e também com a Europa. Voltaremos às posições tradicionais da Argentina”, promete Fulvio Pompeo, porta-voz de Macri para questões de política externa.
Teremos uma posição sensata com os EUA e também com a Europa.”
A primeira amostra dessa virada caso Macri seja eleito deverá acontecer na relação de Buenos Aires com Caracas, especialmente no que diz respeito à prisão de López, um assunto que divide a região, mas que ainda não motivou críticas formais de nenhum Governo latino-americano.
Macri prometeu solicitar uma reunião extraordinária do Mercosul para pedir a aplicação da cláusula democrática contra a Venezuela, caso o Governo Maduro não liberte López, acusado de incitar à violência durante protestos no ano passado. Nesse ponto, Macri tem o apoio do peronista Sergio Massa, terceiro colocado no primeiro turno de outubro, com 21% dos votos. “A Argentina precisa se voltar para o mundo. Tenho um vínculo afetivo com Leopoldo López e Lilian Tintori [esposa de López] e vou lutar por eles e para que a Argentina não se transforme em outra Venezuela”, disse Massa nesta semana. “Temos uma posição muito clara: achamos que a Venezuela neste momento não é uma democracia como as demais, e Maduro está dizendo que os resultados eleitorais não importam. Vamos levar o caso de López para que seja aplicada a cláusula democrática, apesar de não desejarmos ver a Venezuela fora do Mercosul”, afirmou Pompeo.
Para Scioli em Buenos Aires. O macrismo teme que o Governo do Brasil, com seus marqueteiros especializados em publicidade negativa, esteja trabalhando para Scioli. “Esperemos que seja apenas um rumor e que o Governo brasileiro não esteja na campanha argentina. Temos o Mercosul como prioridade e o Brasil como sócio estratégico”, conclui Pompeo. A batalha argentina é, portanto, uma luta regional”.


sábado, 26 de dezembro de 2015

80 ANOS CASAL VIVE JUNTOS



Oitenta anos depois, dona Rosalina ainda ri das piadas do seu Oswaldo. Os dois têm 98 anos e se conheceram em 1935.

Minha mulher, eu e os quatro filhos (dois casais), sete netos (três netas e quatro netos), duas noras e dois genros, ficamos emocionados com a reportagem do Jornal Nacional na Noite de Natal de 2015, porquanto nos conhecemos por apenas cinco meses e estamos casados há 54 anos, cujo relato:"Bodas de Ouro e o Segredo do Casamento" está no blog: theodianobastos.blogspot.com


No Rio de Janeiro, tem um casal que é vencedor. A primeira vez que os olhos azuis brilharam apaixonados, ele não esquece. Foi em 1935.  “Ela estava com uma garrafa de vinho pro pai que foi comprar. Eu passei do lado e disse assim: você vai beber isso tudo? E ela disse: não, é para o meu pai e fui acompanhando e conversando até a porta de casa”, conta Oswaldo Blois, de 98 anos.
“Perguntou o meu nome: ‘como você se chama?’. Eu disse ‘Rosa’. E aí ele disse assim: ‘só falta o cheiro’”, conta Rosalina Blois, de 98 anos.
Jornal Nacional: A senhora gostou da cantada?
Rosalina: Gostei! Gostei que voltei. Fui lá dei o vinho pro papai e voltei.
Eles não sabiam, mas ela voltava para uma vida inteira.
Jornal Nacional: E qual foi a primeira vez que o senhor conseguiu botar a mão na mão dela, pra namorar?
Oswaldo: No dia seguinte.
Rosalina: Ele era muito saliente.
Um ano depois veio o pedido. “Com a cara mais lavada, ele chegou e disse pro meu pai: ‘eu quero me casar com a sua filha’”, lembra Rosalina.
No ano seguinte veio o bebê. Hoje com 79 anos, o Orestes. Seu Orestes teve o Marcelo, e o Marcelo, a Carolina - a bisneta.
Seu Oswaldo e Dona Rosalina estão juntos há 80 natais. As fotos mais antigas já não existem mais. Nas que sobraram, alguns dos muitos natais, quando ela preparava as festas. Hoje isso mudou. “A minha nora sempre prepara tudo e nós chegamos e só comemos”, afirma Oswaldo.
A certidão confirma. O aniversário de casamento é em janeiro. Eles já fizeram bodas de prata, de ouro, de diamante. E agora se preparam para bodas de nogueira. Nogueira é uma madeira forte, mostra que a relação está firme.
Jornal Nacional: Vocês imaginaram que iriam completar 80 anos juntos?
Oswaldo: Nunca, nunca. Essa questão de imaginar é muito difícil, os anos vão passando e você não vai sentindo, quando chega os 80, você diz: ‘puxa! 80 anos!’.
Jornal Nacional: Quando olha pra ele, o que que a senhora pensa?
Oswaldo: Mas como esse cara está feio.
Oitenta anos depois e ela ainda ri das piadas dele. E canta quando ele pede. E juntos eles desejam: “Que muitos outros casais sejam felizes, que procurem ser amigos um do outro. É o que nós somos”, diz Oswaldo.
Fonte: http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/25/12/2015        

domingo, 20 de dezembro de 2015

BRASIL NUMA ROLETA RUSSA, DIZ DELFIM NETTO



Troca de ministro é irrelevante nesta roleta-russa política, diz Delfim Netto





Folha de São Paulo, ANA ESTELA DE SOUSA PINTO
EDITORA DE "MERCADO" 20/12/2015  
A troca de ministros da Fazenda é irrelevante e não afasta a impressão de que o país está "indo para o buraco", diz o ex-ministro da Fazenda Antonio Delfim Netto.
Um dos economistas mais respeitados do país, Delfim foi ministro na ditadura militar e interlocutor dos governos Lula e Dilma, no início do primeiro mandato.
O afastamento começou no final de 2012, quando a presidente insistia numa política econômica que desequilibrou os preços no país e enfraqueceu o setor industrial.
Embora contrário ao impeachment —"seria preciso haver prova de que Dilma foi desonesta"—, ele diz que a administração política da presidente "desintegrou-se". 

"Estamos numa roleta-russa, não num jogo político."


Folha - A troca de ministros da Fazenda faz diferença?
Antonio Delfim Netto - Não. Os dois [Joaquim Levy e seu substituto, Nelson Barbosa] são muito competentes. O problema não é econômico. É político. Não há possibilidade de terminar um ajuste fiscal sem reconstruir primeiro —ou junto com ele, pelo menos– a expectativa de crescimento.
Como se recupera o crescimento agora?
O crescimento é um estado de espírito. O que existe hoje é um desânimo muito grande, produzido pelas dificuldades da economia, que, por sua vez, desintegraram a administração política.
O Brasil é um país hoje em que a administração política está anulada. Um governo que tem dez partidos com 320 deputados, e nenhum partido tem fidelidade ao governo, nenhum deputado tem fidelidade ao partido.
Estamos numa roleta-russa, não num jogo político.
Sem definição do conflito político, então, não há saída?
É mais que isso. Não é só que a situação presente é difícil. É muito pior, a perspectiva é que estamos caminhando para o buraco. O que precisa eliminar é essa perspectiva, e ela só será eliminada se fizermos as reformas necessárias.
MUDANÇA NA FAZENDA






                                                                                     Quais são?
Enfrentar o problema da Previdência, das vinculações. Vinculação é um ato maluco, é a mesma coisa que estar num avião, ligar o piloto automático e esperar acabar o querosene. Ela tira o poder do Congresso e do Executivo.
Precisamos restabelecer certa flexibilidade no mercado de trabalho, o que não quer dizer reduzir direitos constitucionais do trabalhador, mas harmonizar as relações entre trabalhadores e empresários, sob vigilância dos sindicatos, para que se organizem melhor.
Precisa enfrentar também o problema fiscal. A tributação é muito alta, muito injusta. Não vai resolver tudo de uma vez, mas é preciso que alguém apresente ao Congresso essas reformas. Isso obriga o Congresso a enfrentar os assuntos. Hoje se imagina que o Congresso não vai aprovar e não se manda nada.
Há clima político para aprovar alguma reforma agora?
Não. É preciso organizar a política. Temos um sistema sem credibilidade. A troca de ministros é irrelevante. O que é relevante é o Poder Executivo recuperar o seu protagonismo, apresentar ao Congresso as reformas constitucionais necessárias e ir para a rua —conclamar a sociedade a pôr em xeque o Congresso para aprová-las. 

A presidente Dilma tem condições para isso?
Espero que sim. Ela diz, pelo menos, que é guerreira. Não há solução tranquila para o país a não ser a retomada do protagonismo do Executivo.
A reação de desconfiança do mercado financeiro após o anúncio de Barbosa indica que o custo do ajuste será mais alto?
O mercado sabe muito pouco. Basta ver o que pensava no início deste ano e o que pensa hoje.
E a proposta aventada por Barbosa de colocar bandas na meta fiscal?
Não inventa nada, meu Deus! Todos os países desenvolvidos hoje, por tentativa e erro, chegaram à mesma política. Vamos copiar em vez de inventar.
Qual o principal erro do ministro Levy?
O ministro Levy não cometeu erro nenhum. Ele não teve poder para fazer o que precisava ser feito. Confundiu-se o Levy como um fanático do equilíbrio fiscal, que era só uma ponte para ver aprovadas as reformas constitucionais. O Levy nunca viu seu plano adotado, não tem culpa de nada. Tudo o que se atribui a ele vem das medidas tomadas antes. É o pensamento mágico da esquerda infantil, de achar que o efeito vem antes da causa.