Por THEODIANO BASTOS
Não era nem meio-dia quando José Mujica nos
surpreendeu oferecendo "um gole de whisky", logo após uma
entrevista em sua casa, em 2012, quando estava na metade de seu mandato
como presidente do Uruguai.
Mujica também
se recusou a morar no palácio presidencial, e viveu durante os cinco anos da
presidência no sítio onde morreu, na parte rural de Montevideu
Lavou alguns copos, colocou gelo e os encheu
generosamente com a bebida. Depois, distribuiu as doses, e iniciou uma conversa
descontraída que pulava de um assunto para outro.
"Da política vou sair com os pés na
frente", disse naquela ocasião à BBC Mundo — serviço em espanhol da BBC —
o ex-guerrilheiro tupamaro, que governou o Uruguai entre 2010 e 2015.
Como isso, Mujica queria dizer que pretendia se
dedicar à atividade que abraçou ainda jovem até a hora de sua morte.
Uma das principais figuras da esquerda da América
Latina, político uruguaio tinha 89 anos e enfrentava câncer no esôfago que se
espalhou para o fígado
Na última entrevista que deu à mídia uruguaia,
publicada pelo jornal Búsqueda no dia 9 de janeiro, Mujica havia anunciado o
agravamento da doença e a iminente partida: “Estou morrendo”.
“O câncer no esôfago está colonizando meu fígado”,
informou. “Não consigo pará-lo com nada. Por quê? Porque sou um idoso e porque
tenho duas doenças crônicas.” O corpo de Mujica, segundo ele próprio, não
aguentaria tratamento bioquímico ou cirurgia para impedir o avanço da doença.
Em novembro de 2024, o ex-presidente precisou passar por cirurgia que inseriu
stent no esôfago.
Ele anunciou, porém, no dia 9 de janeiro, que não
faria mais tratamentos nem entrevistas. Pediu, portanto, a médicos e a
jornalistas que não o fizessem “sofrer demais”. E pediu para que suas cinzas fosse sepultado com sua cachorra Manuela
“Deixe que eles (os médicos) me cutuquem e, quando
for parar morrer, eu morro”, afirmou. “Estou condenado, irmão. Cheguei até
aqui.” Quanto aos repórteres, Mujica disse que a única coisa que desejava era utilizá-los
para se despedir publicamente dos “compatriotas” e dos “companheiros”;
no mais, pediu que os deixassem em paz, que não pedissem “mais entrevistas, nem
nada mais”.
Ele havia dito, também, que, a partir de então, se
dedicaria ao trabalho na lavoura enquanto o corpo permitisse. “A vida me deu
muitos prêmios”, afirmou, com lágrimas nos olhos, em janeiro. “O principal
deles é que estou a quatro meses de completar 90 anos.”
Mujica: 'Se você não tiver uma causa, a sociedade vai te
enquadrar, e você vai passar a vida pagando contas'
Mujica afirmou, portanto, àquela época, que morria
“totalmente calmo e agradecido”, mas que se arrependia de muitas coisas,
principalmente do fato de que, mesmo tendo sido presidente do Uruguai, ainda
havia pessoas que passavam fome no país.
Finalizou dizendo que morreria em casa, onde deu a
entrevista, e que desejaria ser enterrado abaixo da árvore sequoia onde jaz
Manuela, a cadela de três patas morta em 2018.
Aos jornalistas e
médicos pediu que o deixassem em paz e que não o fizessem "sofrer
demais"
Finalizou dizendo que morreria em casa, onde deu a
entrevista, e que desejaria ser enterrado abaixo da árvore sequoia onde jaz
Manuela, a cadela de três patas morta em 2018Pablo PORCIUNCULA/AFP
Nascido em maio de 1935, em Montevidéu, no Uruguai, o
agricultor José Alberto Mujica Cordano, mais conhecido como Pepe Mujica, foi
presidente do país entre os anos de 2010 e 2015Reprodução Também foi conhecido
por episódios de guerrilha, mas, durante a entrevista ao 'Búsqueda', em janeiro
deste ano, deixou claro que, ao fim da vida, acreditava que esse período da
juventude havia sido um erro e lutava, desde então, pela democracia
Durante o período em que
foi presidente, tinha como meta prioritária a redução dos índices de miséria e
pobreza do Uruguai e tornou-se mundialmente conhecido por declarações
Quem foi Pepe Mujica
Nascido em maio de 1935, em Montevidéu, no Uruguai, o
agricultor José Alberto Mujica Cordano, mais conhecido como Pepe Mujica, foi
presidente do país entre os anos de 2010 e 2015 e uma das figuras mais
importantes da esquerda na América Latina.
A partir dos anos 1990, foi deputado, senador e
ministro da Agricultura, mas, bem antes disso, era peça-chave na política
uruguaia, principalmente no que diz respeito ao combate à ditadura militar que
regeu o país entre 1973 e 1985 — período em que ficou, durante a maior parte,
preso.
Ao todo,
passou cerca de 15 anos na prisão, 11 deles em um calabouço como refém da
ditadura. Após a última soltura, em 1985, devido à anistia
decretada naquele ano, criou o Movimento de Participação Política (MPP) dentro
da coalizão de esquerda Frente Ampla, pela qual foi eleito em 2009.
Também foi conhecido por episódios de guerrilha, mas,
durante a entrevista ao Búsqueda, em janeiro deste ano, deixou claro que, ao
fim da vida, acreditava que esse período da juventude havia sido um erro e
lutava, desde então, pela democracia.
Durante o período em que foi presidente, tinha como
meta prioritária a redução dos índices de miséria e pobreza do Uruguai e
tornou-se mundialmente conhecido por declarações humanistas. Também se recusou
a morar no palácio presidencial, e viveu durante os cinco anos da presidência
no sítio onde morreu, na parte rural de Montevidéu.
SAIBA MAIS EM: https://www.correiobraziliense.com.br/
- https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/mujica-veja-a-repercussao-internacional-da-morte-do-ex-presidente-uruguaio/ - https://www.bbc.com/portuguese/articles/c3wdqyxgq6vo