E o julgamento do
mensalão se estenderá até o próximo ano, coincidindo com a campanha
presidencial de outubro de 2014...
“O
voto de Celso de Mello, que decidiu nesta quarta-feira aceitar os embargos
infringentes no caso do mensalão, repercutiu instantaneamente na sociedade
civil e também entre especialistas. Ouvidos pelo GLOBO, eles demonstram
preocupação com o tempo que o julgamento dos recursos pelo Superior Tribunal
Federal (STF) pode levar e também com a possibilidade de impunidade.
Luciano
Santos, advogado especialista em direito eleitoral do Movimento de Combate à
Corrupção Eleitoral (MCCE), acha que “por mais técnica, polêmica e passível de
divisões a questão”, o voto a favor dos embargos infrigentes “encerra um
crédito que a opinião pública tinha dado ao Supremo Tribunal Federal (STF)”.
Segundo
Santos, o julgamento do mensalão foi, em sua essência, emblemático e muito
eficiente; os réus já haviam sido julgados numa corte privilegiada e, por isso,
“o caso já poderia ter sido encerrado”. Mas o caso não foi o que, para Santos,
“traz uma sensação de desalento e impunidade à sociedade”.
-
Muitas cortes superiores, como o próprio Tribunal Superior Eleitoral (TSE), vêm
interpretando embargos semelhantes como inconstitucionais. O supremo anda,
portanto, num caminho contrário. A discussão não é só técnica, a divisão que se
produziu entre os ministros do STF expõe a disfuncionalidade do Judiciário
brasileiro - declarou.
Para
Luciano Santos, “a lua de mel da população com o STF acabou”. E a população
agora deve ficar atenta a alguns fatores daqui para a frente: como os réus vão
recorrer ao STF, se esses embargos serão votados com rapidez, se serão julgados
em blocos (como ocorreu no julgamento do mensalão), e se o chamado “mensalão
mineiro”, que afeta o PSDB, será avaliado com critérios semelhantes pelo Supremo
- e principalmente antes das eleições de 2014.
-
Preciso não acreditar que a nova composição do STF (com dois ministros novos
indicados pela presidente Dilma Roussefff, Luís Roberto Barroso e Teori
Zavascki, que votaram a favor dos embargos) tenha trazido algum partidarismo ao
julgamento. Mas acho que a decisão desta quarta-feira traz à tona uma discussão
pertinente, que a população precisa promover: será que deve caber apenas ao
presidente indicar a composição do STF? - indagou o representante do MCCE.
Já
Gil Castello Branco, secretário-geral da ONG Contas Abertas, se disse
desagradado com os rumos que o caso levou.
-
Vai ser difícil acordar amanhã. Sonhávamos com um marco para o fim da
impunidade e nos deparamos com os recursos dos recursos, os embargos dos
embargos. O enredo parecia diferente, mas o final do filme será o de sempre. Os
tubarões não irão para a cadeia - protestou.
Cristiane
Maza, da organização Todos Juntos Contra a Corrupção, também expressou
descontentamento. Para ela, a opção de aceitar os embargos infringentes foi
“decepcionante”.
-
Acho que essa decisão vai levar a uma retomada às ruas. É preciso que as
pessoas voltem às ruas. Para o cidadão comum, parece que o Supremo não é
supremo. Havia uma expectativa muito grande para que essa questão não
terminasse em pizza.
Cientista
político da PUC-RJ, Ricardo Ismael diz que o Supremo optou por protelar o
cumprimento das sentenças. Ele afirma que a sensação de impunidade tende a
aumentar na sociedade brasileira.
-
O que mais lamento é que isso vai demonstrar que nem todos são iguais perante à
lei. Infelizmente, para alguns, os julgamentos são ritos sumários. São rápidos.
Para outros, os poderosos, os processos podem se arrastar por anos. Há a
constatação da impunidade - critica.
A
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) disse que não comentará o acolhimento dos
embargos infringentes, “por entender que a questão não representa um caso de
afronta à Constituição”, como informou a assessoria do presidente da OAB,
Marcos Vinícius Furtado Coelho.
Edmar
Bacha, diretor do Instituto de Estudos de Política Econômica Casa das Garças e
ex-presidente do BNDES, diz esperar que haja celeridade daqui para frente.
-
Eu espero que a Corte se dê um prazo fixo: “vamos terminar isso até março do
ano que vem”, algo concreto. Ou então, “não vamos tirar férias para acelerar o
processo de garantir o direito dos réus e assegurar que a Justiça seja feita” -
diz. Fonte: http://oglobo.globo.com/
Grupo de manifestantes leva pizza para a frente do Supremo
Eles
colocaram um gradeado com as imagens do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e
do ex-presidente do PT José GenoinoFonte: O Estado de São Paulo, 18/09/13
Gilmar Mendes diz que o STF não pode funcionar como pizzaria ou como
tribunal bolivariano
MENSALEIROS 6X 5 BRASILEIROS
Como já era esperado, o ministro
Celso de Mello deu provimento ao pedido de “Embargos Infrigentes”, desempatando a favor dos réus do mensalão.
Após oito anos de julgamento, 54
sessões em 2012 e mais oito sessões em 2013, em voto que durou mais de três
horas, houve a reviravolta e agora não sabe quando esse processo terminará.
Esse adiamento levará para a "eternidade" a sentença contra os mensaleiros e significa apenas o triunfo definitivo da impunidade no Brasil.
Desta forma continua melancólica a
percepção da sociedade brasileira com a certeza da impunidade para os riscos e
poderosos, capazes de contratar à peso de ouro, os mais caros escritórios de
advocacias do Brasil, pois sempre contam com juízes sempre solícitos a
encontrar dispositivos que os favoreçam nas decisões.
Vejam os comentários que seguem:
O SUPREMO E OS EMBARGOS INFRIGENTES
Marco Aurélio
Mello
Publicado:
18/09/13
“A
ação penal conhecida como “mensalão” veio a ser julgada pelo Plenário do Supremo
Tribunal Federal. Ocupou praticamente todo o segundo semestre de 2012 — 54
sessões. A decisão condenatória foi impugnada mediante embargos declaratórios
e, na apreciação destes, em 2013, tomaram-se oito sessões. Então, após
exaustivos debates, surgiu a polêmica acerca da adequação de mais um recurso —
os embargos infringentes.
Antes
da Constituição de 1988, o Supremo podia editar normas sobre ações e recursos
da respectiva competência. Então, versou, no Regimento Interno, o cabimento dos
embargos, a pressupor quatro votos vencidos a favor da defesa. Indaga-se:
persistem eles no cenário jurídico? A resposta é negativa, ante a revogação
tácita do Regimento, porquanto a Lei nº 8.038/90, ao disciplinar as ações
penais da competência do Supremo e do Superior Tribunal de Justiça, silenciou a
respeito da matéria.
O
fato gerou incompatibilidade gritante. A razão mostra-se simples. O Congresso
deixou de prever embargos contra as decisões do Superior. Entender de forma
diversa implica afirmar que, julgando este último, por exemplo, um governador
de estado, o pronunciamento, seja qual for o escore, não desafia impugnação,
mas, fazendo-o a mais alta Corte do país relativamente a deputado ou senador,
havendo quatro votos a favor da defesa, abre-se margem a outro julgamento, de
igual natureza e em verdadeira sobreposição. O mesmo raciocínio serve para os
Tribunais de Justiça, quanto a prefeitos, e os Regionais Federais, no tocante a
juízes e membros do Ministério Público Federal.
O
sistema não fecha, no que, considerado o crivo do Supremo, é assentada a
revisão pelo próprio Tribunal, colocando-se em dúvida o acerto do ato
condenatório formalizado. Ao lado disso, a admissão do recurso gera
consequências. A primeira refere-se à quebra do princípio igualitário, porque apenas
os acusados com quatro votos a favor terão o direito a eventual reforma do que
decidido. A segunda concerne à mudança na composição do Tribunal em virtude da
aposentadoria de dois ministros que participaram do julgamento. É dizer: caso
os integrantes que chegaram depois somem os votos aos quatro da corrente
minoritária, a condenação poderá ser transformada em absolvição, dando-se o
dito pelo não dito, para a perplexidade geral. Isso já ocorreu presente a
cassação de mandato parlamentar, no que o novo Supremo concluiu, apesar da
prática de crime contra a administração pública, não lhe incumbir o implemento.
Acrescente-se a problemática da prescrição, uma vez que existe a possibilidade
de haver a diminuição das penas.
Esta
quarta-feira promete definição sobre a quadra vivenciada. É reveladora de novos
tempos? Com a palavra o decano do Supremo, o douto ministro Celso de Mello, a
quem cabe o voto decisivo, ante o empate verificado, de cinco votos pela
admissibilidade do recurso e outros tantos no sentido da revogação tácita do
Regimento Interno. Que o resultado seja alvissareiro!”
Marco
Aurélio Mello é ministro do Supremo Tribunal Federal e vice-presidente do
Tribunal Superior Eleitoral. Fonte: http://oglobo.globo.com
“Gilmar Mendes, ministro
do STF, teve de lembrar nesta terça-feira que o tribunal não pode funcionar
como uma pizzaria. O ministro, que votou contra o cabimento de embargos
infringentes, parece já trabalhar com um cenário em que eles passem a ser
aceitos — Celso de Mello é que decidirá a questão nesta quarta. Caso se admita
o recurso, Mendes defende que se crie um procedimento:
“Tenho a impressão
de que é importante, desde logo, estabelecer ritos, prazos, para encaminhar
este assunto. Quer dizer, que o tema não fique solto. Estou dizendo é que haja,
de fato, uma responsabilidade em relação a isso. Isso aqui não é um tribunal
para ficar assando pizza e nem é um tribunal bolivariano”. O ministro disse
ainda: “Amanhã já pode distribuir processo. Aquele que tiver encaminhado assuma
o compromisso de trazer dentro de um prazo razoável”.
Pois é… Eis o mais
difícil. Como esquecer uma pergunta disparada certa feita por Ricardo
Lewadowski: “Tanta pressa por quê?”. Pressa? O escândalo veio à luz em 2005, a
denúncia foi aceita em 2007, e o julgamento só começou em 2012. Sem a definição
de prazos, não tem tempo para acabar, o que já é uma tradição do Judiciário
brasileiro — uma triste tradição, que nos confere fama internacional. Por falar
em Lewandowski, basta que se lembre o tempo que ele levou para apresentar a
chamada “revisão”. Tudo o mais constante, que se contem outros tantos anos pela
frente.
A referência ao
“tribunal bolivariano” é oportuna. O Poder Judiciário na Venezuela, na Bolívia,
no Equador ou na Nicarágua existe hoje para a) homologar as vontades dos respectivos presidentes, b) para proteger os “marginais do
poder” (como disse Celso de Mello em passado recente) e para c) perseguir os inimigos do regime. A
nossa corte suprema está a caminho de cumprir os itens “a” e “b” da agenda.
Chegar ao “c” pode ser só uma questão de tempo.
Uma vez aceitos os
embargos infringentes nesta quarta, e parece que as coisas caminham nessa
direção, o tribunal cairá num enorme vazio — ou num emaranhado — de
procedimentos. Sem o estabelecimento de um rito, os mensaleiros podem comemorar
a impunidade. Aí é só esperar os filmes financiados pela Lei Rouanet exaltando
os heróis que ousaram desafiar, e vencer, a democracia.” Por
Reinaldo Azevedo